Há uma semana o Brasil se depara com a insólita situação de conviver com dois ministros da Saúde. Um que foi demitido do cargo, mas ainda está lá, o general Eduardo Pazuello. O outro, que foi indicado para a função, porém não foi empossado, o cardiologista Marcelo Queiroga. Na prática, o imbróglio acaba por reforçar a ausência de liderança na área essencial para o país, diante da mais grave crise sanitária já vista no mundo e que nesta segunda-feira atingiu a marca de 295.425 mortos no Brasil em decorrência de covid-19 nas 27 unidades da federação. Governadores, mas também especialistas e servidores da pasta reclamam da situação de limbo quando as mortes pela doença estão em alta e há crise pela falta de medicamentos de intubação.
Até agora, o Governo Jair Bolsonaro não tem uma data exata para empossar o médico Queiroga ―a expectativa é que a posse ocorra na próxima quinta-feira, dia 25. Antes, duas datas haviam sido sinalizadas. Duas são as razões para a demora: 1) o presidente quer encontrar um cargo que possa blindar da Justiça Pazuello, o fiel e subserviente auxiliar que seguiu a cartilha Bolsonaro nos últimos dez meses e é investigado pela sua suposta inépcia na crise de falta de oxigênio em Manaus e; 2) porque Queiroga ainda é administrador de uma das empresas que é sócio. A legislação proíbe que ocupantes de ministérios tenham de gestão em empresas privadas.
Como Pazuello até agora tem foro privilegiado, qualquer processo contra o general precisa ser analisado pelo Supremo Tribunal Federal. Esse benefício, contudo, se perde assim que ele deixar o cargo, e passaria a ser julgado por um juiz de primeira instância. O temor do Planalto é que o fiel aliado de Bolsonaro seja preso em decorrência de suposta omissão na tragédia da capital do Amazonas, quando dezenas de pessoas morreram asfixiadas por causa da falta de fornecimento de cilindros de oxigênio.
Por essa razão, Bolsonaro quer encontrar um cargo que proteja o general da ativa. Chegou a avaliar a possibilidade de se criar um ministério para ele, mas, para isso, seria necessário aprovar uma medida provisória. Descontente com os rumos da saúde, a base de Bolsonaro no Congresso não está unida para votar este tema. Surgiu a possibilidade de alocá-lo nas pastas do Turismo ou das Minas e Energia, por ora descartadas. A outra opção seria uma espécie de exílio, enviando-o para alguma função no exterior, assim como ocorreu com o ex-ministro da Educação Abraham Weintraub, que era investigado pela Polícia Federal e, assim que deixou o ministério, se mudou para os Estados Unidos. Por indicação do Governo Bolsonaro, Weintraub passou a ocupar o cargo de diretor-executivo no Banco Mundial.
Sobre Pazuello, ainda não há uma definição. Na semana passada o atual e o futuro ministros estiveram em agenda conjunta na Fiocruz, no Rio de Janeiro. O EL PAÍS questionou à Presidência, à Casa Civil e ao Ministério da Saúde sobre quais outros eventos os dois participaram juntos enquanto representantes da pasta na última semana. Também questionou quando ocorreria a posse de Queiroga, se Bolsonaro já tinha definido qual cargo seria ocupado por Pazuello e quando o futuro ministro pretendia se desvincular de suas empresas. Os três órgãos não se manifestaram oficialmente.