Por Yago Sales
“Pode entar, pode entar, não tem ninguém, não tem bicho não”. É com este jeitinho infantil que um menino de 4 anos apresenta a sua casa sem higiene. Além da criança, outros dois irmãos – um de três e de sete anos – estavam sozinhos na residência no Setor Vila Finsocial, em Goiânia, quando o conselheiro Paulo Wanderson adentrou o local com o celular filmando.
De plantão, Wanderson filma o quintal antes do garotinho dar um chute e revelar o horror. Não uma casa, mas um amontoado de móveis desarrumados, destruídos. No quintal, o esqueleto de um carrinho de bebê, uma bicicleta infantil rosa inútil, um manequim – sem cabeça e braços.
A câmera foca lodo esverdeado na parede e uma cadeira de fios pela metade. O sofá esburacado, o que antes eram brinquedos esparramados.
Enquanto o conselheiro pergunta se as crianças almoçaram, é possível ver duas panelas com arroz cozido entregues às moscas. “Já almoçaram?”, pergunta Wanderson. “Já”, responde, instintivamente a criança. “Mesmo”, quer saber o conselheiro, que sente o odor da pia coberta de comida e das fezes da irmã do menino-guia de sete anos.
Além dos meninos que perambulavam pelas ruas, o conselheiro encontrou a garotinha de sete anos em cima de uma cama. Com deficiência, sem cuidados adequados, a menina, deitada numa cama, nua, comia as próprias fezes. Na geladeira, encurralada por uma cadeira, apenas água.
Depois que o carro do Conselho Tutelar parou em frente à residência, acompanhada de policiais militares, alguém avisou à mãe das crianças. Ela chegou às pressas. Estava, como ela disse ao conselheiro, trabalhando como ambulante na Rua 44.
Segundo ela, o dinheiro da Bolsa Família e uma assistência dada à filha especial, não conseguia suprir as necessidades da família. O marido dela, que deveria ter ficado cuidando das crianças, simplesmente sumiu.
As crianças foram levadas para um abrigo. Já a mãe foi presa e levada à Central de Flagrantes: o crime tipificado é abandono de incapaz. Mas o seu maior crime, certamente, é o de ser pobre.