Presidente da Comissão Nacional do Idoso, ex-juíza Maria Luíza é suspeita de envolvimento em esquema de estelionato que retirou a terra de um senhor de 75 anos
De dono de uma fazenda avaliada em R$ 11 milhões, Divino Raul Paula e Souza, de 75 anos, passou a ter que catar latinhas para complementar o salário mínimo que recebe de aposentadoria. Esse é o sustento para a casa em que mora com sua esposa, em Hidrolândia, região metropolitana de Goiânia.
A Fazenda Serra Verde, em Hidrolândia, que conseguiu adquirir após muito trabalho – tanto que acabou perdendo dois dedos da mão esquerda enquanto tirava leite, aos 16 anos – se tornou sua fonte de renda, de onde tirava R$ 3 mil pelo aluguel do pasto que, somado à sua aposentadoria, estava perto do valor que julgava ser o necessário para viver tranquilo, R$ 5 mil.
No início de 2019, Divino foi procurado por Sergio Rubens Ribeiro – ligado ao escritório de advocacia de Maria Luíza Póvoa – com uma oferta que aumentaria sua renda. A proposta para o idoso parecia bem simples: ele cederia sua terra para a implantação de um polo industrial e em troca receberia uma quantia mensal, além de continuar com parte da terra. “Eu entrei nesse negócio com a proposta de ceder seis alqueires para fazer o projeto e ficaria com 40% de lucro [do suposto polo industrial] e o resto da fazenda.”
Contratado pelo escritório de Maria Luíza, através do administrador e filho da ex-juíza, Valdemiro Saraiva da Cruz Neto, o corretor de imóveis Marcus Flexa Medeiros foi designado para escriturar a fazenda no nome da Cruz Apoio Administrativo Eireli, de propriedade de Valdemiro. A reportagem procurou o corretor de imóveis para dar explicações, mas não foi atendida.
Segundo documentos obtidos com exclusividade pelo Atilados, a Cruz Apoio Administrativo Eireli não tinha capital suficiente e, por isso, o corretor teria sido orientado a transferir a propriedade rural para a Engecruz Engenharia Ltda, que, à época, tinha como sócios Valdemiro Saraiva e a mulher dele, Camila Soares Reis Cruz.
Por outro lado, a assessoria jurídica foi feita pelo escritório Maria Luiza Póvoa Cruz & Advogados Associados.
Toda vez ao falar sobre a advogada, a voz de Divino começa a se exaltar. “Pra que uma ex-juíza fazer uma situação dessa? Qual o motivo? Ela ao invés de dar exemplo tá dando essa lambança. Isso é um absurdo!”. A indignação é ainda mais estrondosa porque a advogada é presidente da Comissão Nacional do Idoso do Instituto Brasileiro de Direito de Família (Ibfam Brasil). “Uma presidente dando golpe nos outros, que situação, né?”, briga.
Os negócios com Jerry Alexandre, presidente do Sindicato do Arroz
Outra vez não havia capital suficiente para a escritura da fazenda no nome do filho da ex-juíza. Com os entraves, é aí que, misteriosamente, o imóvel é transferido à Cincopar Participações Ltda, de Jerry Alexandre. Presidente do Sindicato do Arroz do estado de Goiás, Jerry também é proprietário da All Nutri Alimentos, que produz e distribui os famosos arroz e feijão Barão.
De acordo com a ação de anulação da escritura do Fórum de Hidrolância, Divino Raul encontrou-se com
“Era pra passar pra um negócio [empresa do filho da ex-juíza, Valdemiro] e depois passaram para o dono do feijão Barão, que na hora eu nem vi pra quem estava passando o documento. Eu só assinei”, relata Divino.
Mesmo documento confeccionado pelo corretor Marcus Flexa Medeiros. É o que a Outra vez, o Atilados procurou o corretor, mas a mulher dele informou que ele não comentaria nada sobre o assunto.
Foi só um mês depois da assinatura dos documentos, quando foi expulso de sua terra, que o aposentado percebeu que havia caído num golpe. “Nem uma fruta eu peguei, perdi tudo”, e complementa “Acreditei e cai, aí depois que fez isso me expulsaram de lá, não recebi um tostão, nada”.
Desde o começo do ano, com cerca de 10 meses de andamento, um entrave jurídico se formou. Mas Divino se mantém confiante, ou pelo menos tenta demonstrar. “Isso aí para essa Maria Luiza é muito pior, ela tá pagando e vai pagar mais caro, agora é que vai começar a arder mesmo, eu tô sentindo.”
A tristeza e a raiva tomou conta de Divino por um tempo, fazendo com que ele parasse no hospital duas vezes. A situação passou a ser ainda mais difícil para o aposentado porque a terra foi alienada pela Cincopar, ao fazer um projeto de financiamento junto ao Itaú no valor de R$ 10 milhões.